quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Oi pai

Eu não sei se tenho o direito de responder a carta que mandou para miha mãe a para a Laura. Mas o farei ainda assim, porque lá tem escrito meu nome e me dei esse direito.

Muitas informações, e no fundo senti que não sabe nada sobre o que eu e Laura passamos mesmo.

Irônico como as situações se repetem, mas os comportamentos mudam... Eu sou mãe agora, separada do pai da minha filha. Ódio, rancor, mágoa? Não. E creio que minha mãe não sentiu nada disso. Sinceramente, senti desprezo pelas coisas que você disse. Como você, com mais de 35 anos muda de carreira assim, de repente, já com 3 filhos e não quer que te chame de irresponsável? E o pior é confrontar com o que me diz hoje, para pedir DINHEIRO para o Dudu (que é estudante e tem 21 anos), porque ele tem obrigação?? Será que ele tem mais obrigação de contribuir com a criação da Bia do que você tinha comigo e com a Laura??

Outra coisa que não gostei nem um pouco é que numa parte você disse que a gente tinha uma relação boa, "lúdica", e que nos víamos toda semana, e deu entender que isso supria nossa carência. Mas a primeira coisa, ser pai é ser lúdico? Não me lembro de ter aprendido alguma coisa com você, não me lembro de você fazer parte da minha educação. Aliás, relacionado a escola, só me lembro das vezes que me esqueceu sentada na porta e das vezes, quando estudávamos no Indi, que não foi capaz, sequer, de perguntar como tinha sido a minha aula. A segunda coisa é que, por acaso não passa pela sua cabeça que a (péssima) relação que temos hoje não seja pelas carências de você na minha infância? Será que eu não senti falta do meu pai quando aprendi a ler, a andar de bicicleta, quando apresentei teatros na escola, na minha adolescência. Vamos fazer uma brincadeira? Farei perguntas e vamos ver quantas delas você pode responder... Com quantos meses eu caminhei? Quando parei de chupar chupeta (essa você vai saber porque a Laura te contou nas férias)? Qual foi a minha primeira palavra? Quem foi meu primeiro namoradinho? Quando foi meu primeiro porre? Quando dei meu primeiro beijo?

Naquela época, e digo hoje no papel de mãe, e não de filha, que a minha mãe fez aquilo por mim e pela Laura sim, você talvez não acredite.. Ela era professora, com filhas gêmeas, e que ambas tinham bronquite.. Quantas noites você acordou pra fazer nebulização na gente? Quantas vezes correu pro hospital pra fazer oxigênio em uma?? São essas coisas que me incomodam hoje. O pai que você não foi.

Tem mais, sobre abandonar a minha mãe, que você disse na carta que isso aconteceria uns 15 anos mais ou menos depois da carta, eu posso te responder hoje. Não. Não vou abandonar a minha mãe. Vou sair de casa, vou ter a minha família, vou crirar a minha filha, mas estarei sempre ao lado dela pra tudo! Ela sabe disso. Encorajando, dando força, fazendo a vida dela um pouco melhor e mais feliz!

Sobre as perguntas que te fiz, você poderia me fazer também, várias! Eu não saberia responder, talvez uma ou duas no máximo. E isso por que? Porque vivemos (no passado mesmo) uma relação que não aconteceu, foi superficial. Você vestiu a camisa de pai, mas nunca se sentiu confortável em usá-la, e nunca fez com que ela fosse praticamente a sua segunda pele. Na verdade ela foi uma camisa largona, que de vez em quando te encostava. Eu conversei isso com o Dudu.. a relação dele com a filha dele é ele quem vai construir, ela vai corresponder àquilo que ele propor.

Tem mais uma coisa que me incomoda e vou aproveitar pra falar: quando criança, vc nunca deu falta, mas eu e a Laura roubávamos biscoito na sua casa. Sim, ROUBÁVAMOS, porque não tínhamos coragem pra abrir o armário da cozinha, não nos setíamos à vontade para isso, daí, quando você ia dormir depois do almoço, uma ficava montando guarda na porta da cozinha, enquanto a outra pegava o biscoito. Agora avalie, o que é o sentimento de roubar pra duas crianças que não faziam nada errado? Que eram alunas exemplares, filhas dedicadas, que faziam ballet e tocavam piano?

O que mais? Eu sinto muito por estar falando isso assim, desse jeito, mas me dói saber que a minha mãe abriu mão de tudo por mim e pela Laura, e que você não abriu mão de nada por nós duas. Ou se abriu, nunca conseguiu que eu enxergasse.

Nesse email eu estou sendo sincera com relação ao que eu senti.. hoje não sofro mais com isso, durante a gravidez tudo o que aconteceu me mostrou o que você sempre foi e durante a gravidez eu sofri, sofri muito. Você não sabe quantas noites chorei pensando no que me disse, idiota, burra e ignorante.. e quantas vezes chorei porque não queria que com a minha filha acontecesse o mesmo comigo. Preferia que ela não tivesse um pai a ter a expectativa de ter um, mas no fundo, nunca tê-lo.. E hoje, fico muito feliz! Porque ela tem um pai, que sabe que ela gosta de cavalo, que não quer que ela fale palavrão, que a ensinou a pedir por favor, que a busca na escola 3 a 4 vezes na semana, que dá janta pra ela, dá banho, que é carihoso. E sim, que me ajuda financeiramente a garantir a comidinha dela, as fraldas, o leite, a escola, as roupinhas, os brinquedos!

Mais do que ser mãe ou pai, a gente tem que sentir isso. Vem de dentro uma responsabilidade que nos faz abrir mão de noitadas e bebedeiras, de viagens. E sou mais triste por isso? Não, de forma alguma! O Dudu é mais triste por isso? Ele que deveria responder, mas creio que não. Fazemos projetos e planos, pra seguirmos as nossas vidas (eu e o Dudu) parte em como era antes, sem a Bia, mas parte considerando um ao outro, companheiros, cúmplices na atividade de educar e crescer junto com a Bia. Ela veio sem querer, mas foi por querer que eu e ele escolhemos esse compromisso. E ele tem 21 anos.

Te admiro hoje, como pessoa, como profissional. Você trocou sua vida aqui, perto da sua família pra ter uma vida longe, admirável! Eu não faria igual! E admiro a minha mãe, como mãe! Ela conseguiu ser mãe e pai, ela conseguiu, mesmo trabalhnado 40 horas semanais, ficar comigo e com a laura tempo suficiente pra nos ensinar tudo que ela sabe, e a nos estimular a saber sempre mais. Se sou o que sou hoje, devo muito a ela. E no que eu errei, foi porque não aprendi direito ou talvez porque precisava aprender sozinha mesmo!

E aprendi com você também. Aprendi a não esperar mais do que as pessoas podem oferecer. Você diz que sente amor, e não duvido, mas é amor do seu jeito. Falar que ama, é fácil, difícil é mostrar pra quem a gente ama que a gente ama.

Eu não me detive a responder a carta, porque tem coisas que só a minha mãe pode responder, o que eu fiz foi tentar responder sobre as expectativas que você tinha que a "plantinha frágil" ficasse maior e mais forte. E eu acho que não ficou, hoje eu acho essa plantinha pequenininha, e muito, mas muito doentinha! A minha relação com você é mais de meros conhecidos, do que propriamente de filha e pai!

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